Porque as organizações da sociedade civil precisam de conselhos (boards) interessados em aprender?

Rogério Silva
4 min readMar 20, 2024

Este artigo foi escrito como contribuição aos pensamentos e práticas sobre desenvolvimento organizacional. Utilize e compartilhe gratuitamente seu conteúdo com sua equipe e seus colegas de profissão, citando: Silva, R. (2024). Porque as organizações da sociedade civil precisam de conselhos (boards) interessados em aprender? Página no Medium. São Paulo: Pacto. Siga este perfil e seja notificado sobre novas produções. A imagem de ilustração é de Engin Akyurt por Pixabay.

Conselhos de administração, ou boards, são instâncias essenciais às organizações da sociedade civil (OSC). Podemos reconhecer três principais competências necessárias a bons conselhos: (1) assegurar que a organização seja fiel a sua missão e valores, o que implica capacidade de formulação e acompanhamento da estratégia; (2) garantir que a organização tenha uma liderança executiva que promova um desempenho operacional saudável; (3) zelar pela sustentabilidade e pelas responsabilidades públicas e fiduciárias da organização (1).

Embora um tanto óbvias, tais competências não se constroem da noite para o dia e não podem ser alcançadas apenas com bons processos de recrutamento, ainda que estes sejam muito importantes. Dois outros vetores têm forte influência no sucesso de um conselho. Primeiro, o reconhecimento de que conselhos são grupos (2) e não um punhado de pessoas isoladas. Esta constatação requer que atuemos para dar coesão aos conselhos, criando espaços seguros para conversas sobre temas sensíveis e cuidando da qualidade do diálogo entre os membros, o que favorece um bom trabalho coletivo.

Além disso, é preciso também considerar a aprendizagem como uma função vital aos bons conselhos, reconhecendo que o desenvolvimento dessas instâncias é processual e requer cuidado. Conselhos se tornam bem-sucedidos na medida em que indagam a realidade, buscam respostas a tais questões e colocam este saber a serviço das organizações, reconhecendo o que elas realizam, mas sendo também capazes de provocar mudanças e impulsioná-las a evoluir. Para realizar estas tarefas, um conselho precisa conhecer os ambientes nos quais as OSC atuam, escutar o conhecimento produzido pelas Ciências, aprender com outros agentes do ecossistema e compreender o que é singular nas organizações que dirigem, aprimorando suas competências a partir deste conjunto de insumos.

Como as formas de aprender são múltiplas, é importante que cada conselho crie suas próprias jornadas de aprendizagem e dêem a elas o caráter de educação permanente (3). Para que elas sejam possíveis, espera-se que os membros de um conselho invistam tempo e energia nesta tarefa, zelando ativamente por duas dimensões de aprendizagem: a pessoal e a coletiva (4). Por mais preparados que sejam individualmente e por mais sucesso que acumulem em suas trajetórias pessoais, o mergulho em um conselho singular de uma OSC também singular requer uma nova onda de aprendizagem, o que pode ser uma bela oportunidade.

Havendo tempo e compromisso, algumas práticas de aprendizagem podem ser bastante potentes quando realizadas com intencionalidade e compromisso, como por exemplo: (a) dedicar parte das reuniões ordinárias ao estudo de casos reais, recebendo membros da equipe operacional, parceiros ou donatários; (b) criar sessões de estudo com cientistas e/ou especialistas; (c) participar de congressos e outras oportunidades de debate público; (d) debater a implementação e os resultados das ações com apoio de avaliações externas; (e) realizar seminários itinerantes e/ou visitas técnicas a diferentes territórios e agentes.

Além disso, há especialistas aptos a desenhar processos de apoio a conselhos, bem como programas in-company, centros universitários e uma série de publicações sobre o tema, todos procurando estabelecer objetivos de aprendizagem e tomar as realidades sociais e organizacionais como “sala de aula”. Os próprios membros dos conselhos também podem ensinar uns aos outros sobre tópicos que afetam a organização e a partir de suas experiências pregressas. Seja qual for a jornada desenhada, é importante reconhecer que quanto maior o compromisso com aprendizagem, maiores os ganhos produzidos pelos conselhos.

Tomar os conselhos como grupos de pessoas que desejam aprender e como instâncias organizacionais que precisam de cuidado para se desenvolver é essencial para ampliar sua relevância. Quando compreendemos que conselhos eficazes assumem que a aprendizagem é uma de suas principais competências, dedicando tempo e recursos a tal educação para a governança, tornamos melhor as OSC e ampliamos a qualidade do que elas produzem para a sociedade. Você já pensou sobre isso?

Este artigo foi escrito com vistas a ajudar você a ativar conversas regenerativas em sua organização. Você pode compartilhar este conteúdo com sua equipe e seus colegas, bem como com os membros de seu conselho. Que tal promover uma boa conversa sobre aprendizagem com o conselho de sua organização? Ao longo dos próximos meses, outros artigos como este serão lançados aqui. Siga este perfil e seja notificado sobre novas produções.

Referências

(1) BoardSource (2010). The handbook of nonprofit governance. Chapter 2: What is governance? Pgs. 15–30. São Francisco (CA): Jossey-Bass.

(2) Lockwood Herman, M. (2022). Is Your Board an Asset Or a Liability? Nonprofit World Magazine, v40, n4. Livonia (MI): Society for Nonprofits.

(3) Oster, S. M. (1995). Strategic management for nonprofit organizations: Theory and cases. Chapter 6. The Nonprofit Board of Directors. Pgs. 75–86. Oxford University Press.

(4) Filed, J. Lifelong learning. (2011). In: Adult Learning and Education. Rubenson, K. (ed). Pgs. 20–28. Academic Press; 1ª edição.

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Rogério Silva

Sócio da Pacto, é doutor em saúde pública pela USP, psicanalista pelo CEP e consultor em avaliação, estratégia e cultura organizacional